15.8.14

DIÁRIO DE UMA EXTERMINADORA DE CÃES

hoje, andando pela rua,
chutei um cachorro morto.
mas foi apenas para me certificar
de que ele estava realmente
morto.

na ausência de latidos,
segui em frente
esboçando um sorriso:
- “menos um cão assassino no mundo!”

os cães são realmente cruéis
quando se trata de gatos.

um dia,
percebi que precisava fazer
alguma coisa boa
pelo mundo.
abracei a causa dos felinos.
os gatinhos só querem ser livres,
e são muito oprimidos.

quando vi um gato dilacerar
uma barata
achei justo.
e vi também
muito senso de justiça
em seu implacável extermínio
aos ratos.
são bichos nojentos,
que empesteiam o mundo!

mas havia ainda um empecilho:
os cães.
os gatos não podem com os cães.
os gatos precisam de mim
para lutar contra os cães.
pobres gatos!

me armei de porrete
e saí afundando os crânios
de todos os cães
que encontrava pelo caminho.

não gosto dessas cabeças caninas
jorrando sangue.
não tenho em mim um prazer assassino.
apenas descobri que os cães
representam o mal.
e para ser boa, estar do lado do bem,
é preciso exterminá-los,
só isso.

me tornei uma pessoa melhor.

se ouço um latido,
já estou lá a postos,
de porrete,
barra de ferro,
pronta para enfrentar
o inimigo.

alguns cães abanam os rabos
pensando que me enganam...
eu sei que a maldade está lá.

ser uma exterminadora de cães
é um bom modo de
mudar o mundo.

estou em paz
ouvindo o canto de um
passarinho.

mas..

o canto parou de repente.

o que estou fazendo
com esse lindo passarinho
entre os dentes?

7.8.14

DOS PROTESTOS PARA AS PÁGINAS: O LIVRO “AS GUERRAS NOS PORTA-RETRATOS” REÚNE POEMAS E FOTOS DAS RUAS

No dia 9 de agosto, data que marca um ano da ocupação da Câmara Municipal do Rio de Janeiro – Ocupa Câmara Rio –, será realizada a festa de lançamento do livro “As guerras nos porta-retratos”, a partir das 20 horas, no Estúdio Hanói.

O livro reúne poemas e fotografias realizados no contexto das manifestações que eclodiram no Brasil a partir de junho de 2013, em que a autora se oculta e se mascara, e revela, ao lado de seus poemas, as escrituras anônimas das ruas nos mais variados suportes (faixas, cartazes, escudos, adesivos, lambe-lambes, carimbos, projeções, pichações, grafite e estêncil). Os dois primeiros capítulos trazem trabalhos das séries “Vandalismo Poético” e “Ocupa Coração”. No último capítulo, poemas da fase anterior às manifestações se intercalam a escrituras de outros períodos históricos, como as dos muros de Paris em maio de 68, sob o título “Velhas fotos amareladas”.

O evento de lançamento, intitulado “Festa das Organizações Amorosas”, também celebrará as lutas políticas que tomaram as ruas no último ano, reunindo ativistas, artistas, advogados, socorristas e midialivristas de diversos coletivos ou independentes; enfim, pessoas que ocuparam as ruas criando uma rede de solidariedade e resistência que se estende até o atual momento, com a luta contra a criminalização dos movimentos populares, perseguições políticas e prisões de manifestantes, acusados de “formação de quadrilha”. Como resposta poética, forma-se então uma “organização amorosa”.

Na programação, haverá apresentações de poesia, performance, música e projeções, com palco aberto para diversas intervenções artísticas. A autora apresentará performances em parceria com as artistas Flávia Cortez e Aline Vargas. Haverá shows de Arnaldo Brandão e Claudia Sette, poemas de Tavinho Paes, Dudu Pererê, Juliana Hollanda, Marcela Giannini, e muitos mais. Entre as projeções, fotos de Marcelo Valle, vídeos de Rafucko, e a exibição de um documentário sobre o Ocupa Câmara Rio, realizado por Ciro Oiticica.

O livro integra o projeto de pesquisa "Vandalismo Poético e outras Artes Marciais", em desenvolvimento no curso de Doutorado em Literatura, Cultura e Contemporaneidade da PUC-Rio, em que a autora aborda relações entre arte e política, a partir dos protestos de junho de 2013 até as manifestações contra a Copa do Mundo no Brasil, em junho de 2014.

Não por acaso, o nome da autora não foi até agora revelado. A estratégia de ocultamento é proposta do trabalho, com o desenvolvimento da ideia de “mascaramento do autor”. A autora poderia dizer “Anota aí: eu sou ninguém”, como uma militante do Movimento Passe Livre de São Paulo a um jornalista que a interrogava sobre sua identidade no auge dos protestos de junho; ou afirmar “Meu nome é Amarildo”, como os ocupantes da Câmara Municipal do Rio de Janeiro a todos os repórteres, ou ainda cobrir o rosto com uma camisa preta como os praticantes da tática Black Bloc. Como afirmou Peter Pál Pelbart, mencionando Agamben, em artigo sobre as manifestações, “os poderes não sabem o que fazer com a ‘singularidade qualquer’”.

Poeta e performer, mestre em Artes Visuais pela UFRJ, tendo passado pelas graduações de Cinema-UFF e Artes Cênicas-UNIRIO, a autora integra o grupo Madame Kaos, e tem no currículo inúmeras apresentações artísticas, e outros três livros produzidos de forma independente. Atualmente, atende pelo nome de Bakunin.

O Estúdio Hanói fica na Rua Paulo Barreto, nº 16, sobrado – Botafogo.  A entrada é franca e o bar não aceita cartão. O livro custa R$20,00.

Link para evento no Facebook: https://www.facebook.com/events/752979524760710/